sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Poesia é sempre poesia.

Versos Íntimos

Vês?! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

(Augusto dos Anjos - Eu e Outros Poemas)

Tenho uma forte predilção por sonetos. Este, em especial, me intrigou desde a primeira vez que o li, quando adolescente. É o primeiro a ser publicado aqui por ser um dos meus favoritos. Augusto dos Anjos, paraibano radicado no Rio de Janeiro, é considerado um dos maiores críticos de sua época - final do século XIX. O choque aos padrões literários vigentes foi inevitável. Entretanto, a originalidade de sua obra lhe rendeu grande popularidade, principalmente por destoar da ideologia da belle époque carioca que imperava naquele momento. Em Versos Íntimos o poeta expressa todo o seu pessimismo  proveniente do cientificismo positivista, às vezes até um pouco filosófico, que lhe era característico.

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